sábado, 1 de novembro de 2008

Um Lamento

Venho, um pouco atrasado é certo, comentar sobre um fato ocorrido recentemente no país.
Demorei um tanto a fazê-lo por dois motivos : o primeiro, é que não quis me precipitar, esperei o desfecho, esperei o pronunciamento de pessoas que trabalham com o isso para poder ter uma opinião bem formada sobre o assunto, e o segundo, e talvez principal, foi a falta de tempo para escrever.
Nunca fui uma pessoa alienada, mas é fato que ninguém viu ainda por aqui abordagem sobre questões sociais. Acho que por ainda estar receoso; a experiência de escrever publicamente -- mesmo que de maneira modesta, para poucos amigos -- é nova para mim, mas agora já me sinto seguro o bastante para trazer a este blog tais discussões.
Sem mais demora, o assunto que gostaria de tratar nesse post é o caso do seqüestro em Santo André, não ele em si, mas pretendo resgatá-lo para fazer outras reflexões.

Acho que qualquer comentário sobre o que ocorreu faz-se desnecessário, uma vez que o estardalhaço midiático criado em cima do caso acabou por deixar todos, mesmo aqueles que não se interessaram e não pretendiam acompanhar tal fato, informados.
Não vou falar sobre o que aconteceu. Também não vou falar sobre minha revolta e insatisfação com a questão da segurança (ou seria insegurança?) pública do país pois, afinal, são assuntos conhecidos de todos e não quero cair na mesmice.

Sobre a ação da polícia, um breve comentário:
Ela foi precipitada e errou. Devolver a refém liberta ao cativeiro é algo inconcebível. Não quero entrar na polêmica do “houve ou não houve um tiro antes da invasão?”, pois isso não muda em nada a responsabilidade da polícia no triste desfecho do caso. Errou e ponto.
Tenho escutado constantemente coisas do tipo “porque um atirador de elite não matou logo de vez o seqüestrador?” , “se fosse nos EUA tinha sido diferente, lá eles matam mesmo” ou apoio à declaração do Cap. Pimentel ( ex-BOPE) que se dependesse dele a polícia não invadiria o local sem armas letais.
Tenho escutado isso, inclusive, de pessoas cuja opinião eu respeito, mas não concordo por um simples motivo:
O Estado deve zelar pelo bem estar do cidadão e tem responsabilidade sobre a formação, saúde e integridade física dele, torne-se ele um criminoso ou não.
Até os disparos que tiraram a vida de uma garota e feriram a outra, o seqüestrador não havia feito menção efetiva de atirar, portanto o não uso de um atirador de elite no caso foi sim, correto. Claro que um disparo certeiro em Lindemberg teria evitado a morte de Eloá, mas quem poderia prever que o desfecho seria esse?
Para ser mais claro, a ação da polícia deve sempre visar a integridade das vítimas, primeiramente, é óbvio, mas também do seqüestrador, e foi nesse sentido que a polícia tentou agir. Infelizmente, sem sucesso.

Não quero levar muito mais adiante essa discussão porque a mídia já a explorou tanto que acho que todos já estão mais do que fartos dela.
O que eu pretendo abordar aqui é algo que na mídia não se tem visto, pois diz respeito a ela e a sua ação.
Algo tem sido discutido sobre isso entre a elite pensante, é possível encontrar alguma coisa sobre o assunto na internet ( gosto muito do
http://www.observatoriodaimprensa.com.br ), mas é uma pena que esse tipo de discussão não chegue as grandes massas, que têm a mídia como principal fonte de informação e principal formadora de opinião.
Mas é compreensível. Que interesse teriam as redes de rádio e TV em discutir sua própria forma de agir e suas responsabilidades?

Pra começar, gostaria de dizer que o que se viu nos últimos dias foi, no mínimo, deplorável. Esse show do horror proporcionado pela transmissão do seqüestro quase que 24hrs por dia é não só de uma irresponsabilidade imensurável como repugnante. Ver boa parte da nação esperando o fim do caso como quem espera o último capítulo de uma novela me deixa revoltado e triste ao mesmo tempo.
Em nenhum país que se preze um seqüestro é transmitido. Será que ninguém percebeu ainda que esse tipo de coisa só atrapalha a polícia e as pessoas realmente interessadas em resolver a situação? O número de operações fracassadas do GOE é muito baixo para os padrões brasileiros. Por que falhou nessa? Coincidência?
A pressão exacerbada que a opinião pública exerce em casos como esse sobre governos e Estados gera, por vezes, soluções improvisadas que quase sempre se mostram desastrosas. Quer outro exemplo que não seja o caso Eloá? Em 2005, se não me engano, um policial do BOPE ao tentar matar um seqüestrador atingiu a vítima e a matou.
Logo virá outro caso parecido com esse. E aí? O que vamos fazer? Comprar pipocas e acompanhar outra tragédia?
Talvez estivesse na hora dopapel da mídia ser repensado e suas responsabilidades também. Não pretendo dar aqui soluções, pois não as tenho, mas vale a pena pensar no assunto.
Bom, era isso que eu queria lembrar sobre o caso. Não acho que a mídia foi a grande responsável por tudo que ocorreu, mas sei que ela tem sua parcela de culpa, e queria, com esse post, fazer com que não nos esqueçamos disso.





PS: Não pensem que por tudo que escrevi eu acredite que esse tipo de coisa só ocorre no Brasil porque o país é uma merda e que a Rede Globo é uma emissora atipicamente má e todas essas coisas que ouvimos em conversa de boteco.
O que ocorreu aqui ocorre também em outros países, – obviamente na Inglaterra, França ou em outros Estados onde a mídia é mais responsável e melhor fiscalizada uma transmissão como essa não ocorreria, mas acontecem coisas similares – mas não com tal intensidade. Esse é um fenômeno recente e mundial.
Outro ponto é que o fenômeno não tem efeito apenas imediato. Quero dizer no sentido de que esse sentimento de que “algo deve ser feito” não aparece apenas em casos como o seqüestro de Santo André, mas pode aparecer em longo prazo e ficar incrustado na sociedade.
Logicamente essa revolta deve existir, afinal as coisas quando estão mal devem ser mudadas, porém isso do “algo tem que ser feito” sem a reflexão da sociedade como um todo de o que seria esse “algo” e como ele seria “feito” gera medidas improvisadas e equivocadas também nos planos de certos governos.
Um exemplo do que digo aqui é a ocupação dos morros cariocas pelo exército que culminou com confrontos e até morte de jovens inocentes no começo desse ano.
Em casos como esse, os governos, pressionados pelo povo e pela mídia, sentem-se forçados a mostrar que “estão fazendo algo” sem se preocuparem se esse algo vai resolver o problema ou piorá-lo, o importante é fazê-lo para garantir a próxima eleição.
Tudo tem que ser pensado e refletido, não só pelos governantes, mas também pelo povo. A mídia tem força para ajudar nisso, mas não o tem feito. Infelizmente, tudo o que se tem visto por parte da mídia são casos como o de Santo André, que não geram qualquer reflexão e só aumentam esse sentimento de que “algo tem que ser feito”.

4 comentários:

Murilo disse...

nem li o texto inteiro Rodz...
que mané sequestro! se não fosse você falar disso, em mais uma semana ninguém lembrava.
Mais um crime midiático...
Faça comunicação, vai perceber que essas explorações de casos isolados, recebem manutenção de tempos em tempos.

Abraço, continue com a boa redação! =]

Ana Thalita disse...

Realmente, fato imensurável Rodz.
Boa abordagem que fez sobre a intervenção da imprensa na atuação do caso. A mídia “ás vezes” é um caos mesmo (por modéstia), tenho forte convicção de que não ajudou em nada na situação que se seguiu, pelo contrário. Mas não vou me prolongar mais nesse assunto, você já disse tudo a respeito.
Aliás...é um caso para ser discutido durante horas se for levantar todos os aspectos. Mas
vou parando por aqui mesmo...rs

***Hey, agora sim..consegui fazer um blog sem problemas(pelo menos por enquanto). ;)

Bjo!

Unknown disse...

é..

Mura disse...

Cara, o que a grande midia tem feito é justamente dar a pipoca pro pessoal assistir ao show. Aquele velho ditado de que a midia só mostra o que o povo quer ver é uma puta mentira, a mídia tem uma capacidade de "fazer querer" nas pessoas. Sem nenhuma mensagem subliminar nem técnicas avançadas de psicologia ou hipnose.
A ver pela mídia de hoje em dia me lembro de outro ditado, "a religião é a muleta do povo". Pois bem, hoje é a mídia que faz esse papel de pacificação da galera e de dar alguma coisa que faça a vida das pessoas ter sentido ou pelo menos passar mais rápido. E o que eles fazem é colocar na cabeça de todo mundo que, de fato, as pessoas precisam de shows o tempo todo.
"E agora as notícias do futebol..."